quarta-feira, março 30, 2016

troncos, não mais

de alguma forma
escravos do nosso tempo

corpos poderosos
belos corpos
rostos afáveis
desejos deslumbrantes

astúcia mental
invejáveis dizeres
e mergulhos primorosos
na estética da consciência

à beleza e presença de espírito
reservou-se  autoflagelação
condenadas ao desaparecimento

pessoas incríveis, desejos incríveis
todos perdidos ou atrasados por ordenanças
domínio de machos encarnados no Estado, constituição

da primazia hollywoodiana
e dos nítidos brancos de olhos azuis
às rodas triunfais de tambor de crioula
e aos negros escondidos em seus guetos

sinto agonia por todos
que ainda não puderam
o mais simples do óbvio:
viver o que acreditam, orgulhando-se

se há um levante solar
não se diz o mesmo
de uma luz apagada
pela fraqueza do controle

gays, lésbicas
trans, bis, pans
pela sexualidade mutável
faça-se o corpo-manifesto

essas cidades de merda
então falidas, matando gente
ainda que a existência marginal
grite liberdade dos becos escuros

quero ouvir tambores
e ver cinema mainstream
tão confusos quanto eu
perdidos de dominadores e dominados

quero a ideia de macho
de território e nação
longe do âmago, da arte
e da filosofia

quero ainda ver o dia dos corpos
esbeltos ou gordos, simétricos ou diferentes
quero encontros de toda ordem
sem especular falso amor

quero apenas gente
em vasta diferença
construindo saberes
e desbancando certezas

quem quiser ir
pode ir
a força está
em ir embora

ninguém nasceu fixo
obteve raízes celestes
o corpo é movimento
criação dançante

partir em viagem
aos encontros
mais lúgubres e afetivos
mais alegres e loucos

se ainda há possibilidades
abandonem-se os limites
dos medos da morte
dos medos de se encontrar mais uma vez

meu corpo clama por afeto
pela sensação de ser mais de um
corpos clamam por ação e descanso
ninguém é obrigado ao 100% toda hora

por isso, amar e vagar
enquanto as pernas aguentam
mudar de rumo, seguir
ventos profanos, profundos

distante da minha mente
verei sol nascer no sono
verei florestas e grandes festas no concreto
verei água limpa e bêbados sorridentes

e que os grupos se façam
nos diferentes ritmos
os mais velozes, outros parcimoniosos
na devida tolerância da cooperação

quero correr com quem corre
e se tiver de parar, solidarize-se
ninguém é obrigado a nada
obriga-se por afeto, então não há obrigações
nem obrigado. gracias!

e se o cansaço virar dor
fuja para bem longe
desvie das maldições
passe ao largo dos sem-amor

ao manifesto feminino, à fraternidade
meu corpo clama por beleza
por desejos de consciência
aos troncos, meu nunca mais

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